quinta-feira, 28 de abril de 2011

O Mundo de Arthur




Arthur vai nascer no inverno. Sua chegada vai aquecer sua familiazinha ansiosa e aconchegante. Enquanto o inverno não chega, Arthur dorme e brinca nas águas aquecidas e ocultas do ventre de sua mãe. O mundo de Arthur é macio e seguro. O mundo de Arthur é mágico!
Arthur ainda não sabe que o planeta terra é lindo e azul! Ele não sabe que vai nascer no cerrado um dos biomas mais belos, ricos e diversificados do mundo. Arthur não sabe que estamos destruindo o cerrado, talvez Arthur não veja e não venha a conhecer os frutos originais do cerrado, seus animais instigantes e suas flores singelas e únicas. Talvez, ele não vá brincar de descobrir desenhos em nuvens, em um céu que mais parece um mar de cores e luzes. Arthur dorme e brinca no ventre de sua mãe, enquanto isso: Estamos destruindo o cerrado!
            Nos últimos anos grande parte do cerrado foi destruída, apenas 19% desse espaço encontra-se preservado. A savana esta forçadamente cedendo espaço à soja, a cana e ao gado. No mundo de Arthur o cerrado será uma seqüência monótona e silenciosa de um verde melancólico e homogêneo. O cerrado de Arthur será triste!
Arthur poderá não conhecer várias das estimadas 935 espécies de aves que vivem e das 148 que são especificas no cerrado, inúmeras delas canoras. Passarinhos tão diversos e coloridos! Tão frágeis! Tão delicados! Os primeiros a serem vítimas das grandes monoculturas extensivas e seus fertilizantes e agrotóxicos diversos, espalhados na terra nua, como sementes mortais, atraindo os pássaros que incautos se alimentam delas e envenenados morrem em seguida, produzindo um cenário devastador. Assassinam-se os canários, os sabiás, os curiós... A natureza fica de luto!
Crianças e passarinhos sempre foram parceiros definitivos. Meninos perseguem passarinhos, os passarinhos fogem e encantam as imaginações dos meninos. É urgente proteger os passarinhos do cerrado. As avezinhas multicoloridas que são os peixinhos de um céu espetacular, que no cerrado é um mar.
Arthur também não sabe ainda, que vai nascer, em uma região, considerada “o berço das águas”. Ele não sabe que o cerrado contribui com a vazão que flui em oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras, sendo fundamental para os rios Paraguai, Parnaíba, São Francisco e Tocantins-Araguaia.
Uma região com terras de aparente aridez, mas prenhe de águas em suas mais diversas condições: São nascentes inúmeras e inesperadas, são pequenos corpos hídricos, que se definem em riachos silenciosos ou turbulentos, com corredeiras e quedas d’águas que formam cachoeiras de belezas infinitas.
São tantas as águas, são tantos seus caminhos e suas diversidades. Águas gélidas, translúcidas e rápidas como as de Pirenópolis. São águas profundas, generosas e cheias de mistérios como as do Araguaia. São águas singelas, faceiras e traiçoeiras, como as dos rios de médio porte, como o prosaico Rio Vermelho, ou o dissimulado Rio das Almas. E as águas encantadas de Caldas Novas, águas que saem do ventre da natureza quentes e translúcidas.
Mas apesar de tanta abundância de águas, talvez Arthur sinta sede, estamos degradando as águas do cerrado. Quando Arthur nascer já estará em coma o rio pioneiro de Goiânia, o antes farto e extenso Rio Meia-Ponte. Arthur viverá numa Goiânia cujas águas estão perdendo sua capacidade de satisfazer um dos instintos primeiros dos seres vivos, “saciar a sede”.
Arthur não vai brincar nas águas dos riachos de sua cidade, não verá as nuvens de borboletas amarelas que se agasalham em suas margens, não vai pegar peixinhos com peneiras, como fez seu pai, nem vai se deliciar com a descoberta de ninhos de passarinhos. O mundo de Arthur não terá as surpresas deliciosas da natureza!
Arthur é filho do meu amigo, o jornalista Elder Dias, mas pode ser qualquer criança que vai nascer em um mundo que está sendo estupidamente destruído. É mister, é urgente, é nossa obrigação deter a devastação, reparar, recuperar e manter sustentável as belezas inenarráveis do nosso cerrado, do Brasil e do nosso planeta Terra.
O mundo de Arthur pode e deve ser repleto de verde em todos os seus matizes, cheio de sol e luz, rendilhado de águas límpidas e inconstantes, perfumado de flores, frutas e ervas raras e preciosas. Um mundo em que o canto dos pássaros será permanentemente difundido pelo vento e misturado aos barulhos encantados da natureza.
O mundo de Arthur depende de nós. 



Tânia Fonseca.
socióloga
taniassfonseca@hotmail.com