quinta-feira, 28 de julho de 2011

TEMPOS ESTRANHOS!

Vivemos tempos estranhos! Estamos sempre cansados e sobrecarregados. Estamos todos sempre ocupados e atrasados.

Terceirizamos quase todas as nossas atividades: O serviço doméstico é das diaristas ou de uma esposa ou casais estafados e apressados. A refeição, que antes reunia a família, agora é engolidas às pressas nos “fast foods” espalhados pela cidade. O cuidar dos filhos, a educação e a formação indentitária das crianças, antes o projeto maior de pais e mães, hoje é delegado às escolas, creches e empregadas domésticas ou muitas vezes às ruas. A família espaço de aconchego e segurança, parafraseando Drumonnd, “é uma fotografia na parede, e como dói”.

Tempos estranhos! Tempos de solidão! Nunca antes estivemos tão sós, individualizados, ainda que imersos na dependência de serviços terceirizados.

Não conhecemos nossos vizinhos! A menina Lucélia foi torturada durante anos junto a vizinhos ocupados demais, cansados demais, que após os fatos expostos, se perguntavam. – Como? Quando? Porque?

As casas, antes lares com quintais, hortas e pomares e com portões displicentemente abertos, com cercas de arame ou mesmo cercas nenhuma. Lares receptivos e confortáveis, ainda que humildes, transformaram-se em pequenas ou grandes celas, com grades, alarmes e cães ferozes. Mantendo a maldade de fora, mas em contrapartida impedindo o companheirismo e a afetividade de entrarem.

Somos seres solitários, absurdamente compromissados. O trabalho, atividade universal, construtor e definidor de nossa identidade e consequentemente de nosso posicionamento na sociedade nos absorve com uma fúria avassaladora. Em nome do trabalho delegamos e protelamos todas as nossas aspirações, nossos desejos e nosso tempo.

Não temos tempo! Estamos permanentemente atrasados, fragmentamos os ciclos do amor. Não conhecemos as pessoas, as desejamos e possuímos, sem o tempo necessário ao amadurecimento e à noção de pertencimento.

Não temos tempo, nem disponibilidade, nem disposição, para conhecermos as pessoas. A amizade se transmudou a companheiros de bares, de festas e eventos banais e passageiros. As adversidades, os grandes projetos e sonhos pessoais quase sempre são realizados e superados com as ausências horrorizadas dos supostos amigos.

Não temos tempos de termos amigos! Não temos tempo de sermos amigos! De sermos gentis, de sermos recíprocos e solidários. Mantemos dos conhecidos, uma distância razoável que não permita que nos sintamos responsáveis por suas alegrias e não tenhamos que ceder nosso colo para amparar os infortúnios.

Tempos estranhos, em que telefonemas não são retornados, que confraternizações não são realizadas – por conflitos de agendas - E o natal, um evento, doméstico e religioso, inerente à família, vizinhos e conhecidos, hoje, se realiza em filas quilométricas dos shoppings e lojas de departamentos.

Tempos em que os filhos são mantidos distantes, em infindáveis atividades extraclasse, os velhos em asilos e abrigos, sempre questionáveis e os doentes em mãos desconhecidas e nem sempre gentis e desejáveis.

Tempos estranhos em que se deve morrer nos hospitais, longe dos entes queridos, em que os funerais devem ser breves e impessoais e o luto contido e efêmero. Não temos tempos para a tristeza! Tempo esse, que exige seres humanos, permanentemente jovens, bonitos, ricos e saudáveis!

Vivemos tempos estranhos...Tristes, solitários e rápidos, absurdamente rápidos, o que é um consolo. Tempos melhores virão!





sexta-feira, 22 de julho de 2011

O mistério!





Adivinha o que eu tenho entre os seios? Perguntou ela maliciosamente!
- Pérolas falsas!?  Respondeu ele estabanado.
- Não! Sussurou ela deliciada com a descortesia curiosa dele.
- Dinheiro!? Mulheres adoram guardar dinheiro entre os seios!
Ela riu arrulhadamente e se estirou no sofá.
-Não! Enfatizou ela com gosto.
E o mistério se debateu entre os seus seios.
Então ela o chamou baixinho. Levantou o decote do vestido e disse como em confissão. - Veja!
Ele olhou os seios pequenos e brancos e percebeu a avezinha azul adormecida entre eles. Ficou  atônito, surpreendido pelo inusitado da descoberta. - Que lindo! Um beija-flor!
Ela sorriu gostosamente! Era comovente a expressão de menino nos olhos dele.
- Sim! Um beija-flor!
E ficaram ali suspensos num instante mágico! Uma mulher com um ninho entre os seios, um homem desvendando um mistério e um beija-flor inquieto e azul...






quarta-feira, 13 de julho de 2011

OLÍMPIA...

Quando Olímpia se apaixonou, imediatamente, começou a enlouquecer. Seus olhos de rasas nuances verdes tornaram-se turvos e profundos, e todos perguntavam: “Que olhos de espanto são esses Olímpia?” Olímpia não respondia e seus olhares se perdiam na escuridão do verde e nas profundezas do desejo.
            Seu corpo de talhe forte, forjado desde a infância, no trabalho árduo e nas perdas irreparáveis, adquiriu uma moleza songamonga, uma “lesera” descuidada, um não sei o quê de vontades muitas e uma inquietude contrastante e desconcertante.
            Muitas vezes, o escuro da noite, a surpreendia em pleno dia e, vezes tantas, os dias invadiam as madrugadas, ensolarando seus sonhos e iluminando seus pesadelos. E muitas foram às tardes presenteadas pela aurora! E o tempo se perdia num labirinto de luzes e sombras...
            Olímpia se apaixonou assim, numa tarde descuidada, e já à noite, teve sonhos com flores e serpentes. Ao amanhecer, já exalava um perfume perturbador e indefinido que deixava os homens inquietos e barulhentos e as mulheres alertas e vigilantes. Seu cheiro atraia os olhares e deixava os ambientes desconfortáveis e não tardou a atrair também, os pássaros, as borboletas e outros pequenos insetos. Como se o amor e o desejo tivessem lhe transformado em um pequeno jardim selvagem e intenso.
            Foram várias as manhãs em que o porteiro perplexo recolhia da calçada, os pardais e beija-flores, mortos e feridos no embate inglório contra a vidraça fechada da janela de Olímpia. E os vôos desordenados das borboletas escuras, obrigavam os outros moradores a manterem os vãos fechados e a maldizerem do calor e do inusitado de serem reféns dos caprichos da natureza.
            Olímpia, absorta em sua paixão desmedida, escrevia cartas, idealizava encontros, arquitetava diálogos e perdia-se em carícias e toques de uma ternura incondicional. Distraída com os arroubos do seu sexo, não percebia o vigor selvagem de seus cabelos que cresciam caudalosamente, cobrindo as costas, enroscando em suas pernas e negando terminantemente a se deixar ajeitar por tranças, laços ou fitas. Os cachos rebelavam-se aos favores de pentes e escovas e emolduravam seu rosto numa selvageria lasciva, contornado e dando ao seu perfil uma aparência de uma Medusa muito branca e muito jovem.
            Não tardou, para que todos percebessem junto à presença de Olímpia, um calor desconcertante, uma sensação inebriante de desejos vários e indefinidos. Receosos de percepções tão inusitadas, que os faziam a se entregarem em abraços calorosos e demorados com pares totalmente desconhecidos: Olímpia passou a ser ostensivamente evitada. Instintivamente todos se distanciavam, temerosos e inseguros.
            Olímpia entregava-se despudoradamente a um desejo intenso e absoluto. Não entendeu, ou melhor, recusou terminantemente a aceitar que seu amor fosse rejeitado. O belo homem, responsável por tanta paixão. Surpreendido e sem nenhuma sutileza disse: não. Não deixou nenhuma possibilidade de diálogo, afastou-se de forma definitiva, fechou em absoluto qualquer possibilidade de aproximação. O mundo de Olímpia quebrou-se...E a luz se esvaiu.
            Uma noite acabrunhada e silenciosa acalentou o pranto inconsolável de Olímpia. Uma tristeza sem fim tingiu de cinza as paredes nuas do seu quarto e suas lágrimas, num vigor inesgotável de fonte, encharcaram os lençóis e as fronhas. E um frio implacável invadiu sua alma e dominou seu coração com as garras gélidas da morte.
Dizem, que ao amanhecer, uma nuvem de borboletas azuis cobria o belo corpo nu de Olímpia estendido na calçada. Dizem, que eram tantas e tão belas! Que todos se comoviam quando se aproximavam. Porque sabiam estar diante de uma mulher que morrera por amar mais do que pode.


Tânia Fonseca