quarta-feira, 13 de julho de 2011

OLÍMPIA...

Quando Olímpia se apaixonou, imediatamente, começou a enlouquecer. Seus olhos de rasas nuances verdes tornaram-se turvos e profundos, e todos perguntavam: “Que olhos de espanto são esses Olímpia?” Olímpia não respondia e seus olhares se perdiam na escuridão do verde e nas profundezas do desejo.
            Seu corpo de talhe forte, forjado desde a infância, no trabalho árduo e nas perdas irreparáveis, adquiriu uma moleza songamonga, uma “lesera” descuidada, um não sei o quê de vontades muitas e uma inquietude contrastante e desconcertante.
            Muitas vezes, o escuro da noite, a surpreendia em pleno dia e, vezes tantas, os dias invadiam as madrugadas, ensolarando seus sonhos e iluminando seus pesadelos. E muitas foram às tardes presenteadas pela aurora! E o tempo se perdia num labirinto de luzes e sombras...
            Olímpia se apaixonou assim, numa tarde descuidada, e já à noite, teve sonhos com flores e serpentes. Ao amanhecer, já exalava um perfume perturbador e indefinido que deixava os homens inquietos e barulhentos e as mulheres alertas e vigilantes. Seu cheiro atraia os olhares e deixava os ambientes desconfortáveis e não tardou a atrair também, os pássaros, as borboletas e outros pequenos insetos. Como se o amor e o desejo tivessem lhe transformado em um pequeno jardim selvagem e intenso.
            Foram várias as manhãs em que o porteiro perplexo recolhia da calçada, os pardais e beija-flores, mortos e feridos no embate inglório contra a vidraça fechada da janela de Olímpia. E os vôos desordenados das borboletas escuras, obrigavam os outros moradores a manterem os vãos fechados e a maldizerem do calor e do inusitado de serem reféns dos caprichos da natureza.
            Olímpia, absorta em sua paixão desmedida, escrevia cartas, idealizava encontros, arquitetava diálogos e perdia-se em carícias e toques de uma ternura incondicional. Distraída com os arroubos do seu sexo, não percebia o vigor selvagem de seus cabelos que cresciam caudalosamente, cobrindo as costas, enroscando em suas pernas e negando terminantemente a se deixar ajeitar por tranças, laços ou fitas. Os cachos rebelavam-se aos favores de pentes e escovas e emolduravam seu rosto numa selvageria lasciva, contornado e dando ao seu perfil uma aparência de uma Medusa muito branca e muito jovem.
            Não tardou, para que todos percebessem junto à presença de Olímpia, um calor desconcertante, uma sensação inebriante de desejos vários e indefinidos. Receosos de percepções tão inusitadas, que os faziam a se entregarem em abraços calorosos e demorados com pares totalmente desconhecidos: Olímpia passou a ser ostensivamente evitada. Instintivamente todos se distanciavam, temerosos e inseguros.
            Olímpia entregava-se despudoradamente a um desejo intenso e absoluto. Não entendeu, ou melhor, recusou terminantemente a aceitar que seu amor fosse rejeitado. O belo homem, responsável por tanta paixão. Surpreendido e sem nenhuma sutileza disse: não. Não deixou nenhuma possibilidade de diálogo, afastou-se de forma definitiva, fechou em absoluto qualquer possibilidade de aproximação. O mundo de Olímpia quebrou-se...E a luz se esvaiu.
            Uma noite acabrunhada e silenciosa acalentou o pranto inconsolável de Olímpia. Uma tristeza sem fim tingiu de cinza as paredes nuas do seu quarto e suas lágrimas, num vigor inesgotável de fonte, encharcaram os lençóis e as fronhas. E um frio implacável invadiu sua alma e dominou seu coração com as garras gélidas da morte.
Dizem, que ao amanhecer, uma nuvem de borboletas azuis cobria o belo corpo nu de Olímpia estendido na calçada. Dizem, que eram tantas e tão belas! Que todos se comoviam quando se aproximavam. Porque sabiam estar diante de uma mulher que morrera por amar mais do que pode.


Tânia Fonseca


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