terça-feira, 2 de agosto de 2011

Crianças entre lobos!


            
           A infância atual está revestida de características absurdamente contraditórias: Nunca antes as crianças foram tão enaltecidas, mimadas e amadas, beirando muito das vezes a um endeusamento inconveniente e alarmante. Temos um cotidiano movimentado por um exército de crianças que estão no poder absoluto da extremamente frágil instituição familiar. São pais subordinados de forma irrestrita a toda uma rede de caprichos e manipulações infantis. Pais perplexos frente a filhos revestidos em miniaturas de ditadores. “Eu quero!”, “Eu faço!”, “Eu posso!”.
Paralela a essa infância consumista e destituída dos claros limites da proteção e do respeito ao próximo, nos defrontamos com um universo infantil emoldurado pela indiferença, a banalização e a crueldade sem limites para com as crianças. Presenciamos tantas atrocidades contra as crianças atuais, ressaltando as brasileiras e enfatizando as da grande Goiânia, que o espanto e um silêncio estarrecedor parece ser o único gesto possível de indignação.
São crianças que em algum instante são tidas como inconvenientes, desnecessárias, incomodadiças. Crianças que não se harmonizam com o espaço quase sempre libertino, egoísta e imediatista dos pais. Portanto propensas a serem jogadas pela janela como foi Isabela Nardoni pelo “pai e a madrasta”. Ou o garoto Lucas 6 anos pelo “pai excessivamente apaixonado”. Crianças que são mortas e esquartejadas como os irmãos Igor, de 12 anos e João Victor, de 13 anos, pelo “pai e madrasta”. Outras queimadas e torturadas com Lucélia 12 anos pelos “pais patrões”. Inúmeras recém-nascidas que são imediatamente abandonadas no lixo, em terrenos baldios ou outras ambientes totalmente adversas, por mães pauperizadas em todos os aspectos de sua humanidade. E como se o ato de matar e esquartejar não fossem suficientes, a menina Raquel 9 anos foi estuprada e abandonada dentro de uma mala em uma rodoviária em Curitiba por um adulto desconhecido e entediado.
São tantas as ocorrências e tão bizarras e tão impensáveis na condição humana que em sua maioria se vangloria de ser moldada à imagem e semelhança de Deus, que só nos resta o espanto.
A modernidade exige adultos ocupados, rápidos, multidisciplinares e permanentemente sobressaltados e inseguros. Estamos sempre atrasados e insatisfeitos. Exaltados demais! Depressivos demais! Humanizados de menos! Estamos construindo uma realidade adversa às crianças. Não as desejamos pelo motivo que deveria ser único e absoluto. “O desejo incondicional de amar um outro ser humano...”.
Queremos as crianças por vaidade: “O filho que perpetua a genética, os negócios, a tradição”. Por interesse: “o filho amparo futuro”. Por solidão, “o filho acompanhante”: Por urgência biológica: os filhos temporões”. A tão famigerada criança que nasce para restaurar ou fortalecer o “amor sensual” e o frágil equilíbrio de famílias fragmentadas. Pobres crianças essas, que serão as primeiras que, no fracasso de tão absurdas e improváveis expectativas, serão jogadas no limbo da indiferença, na guerra obscena entre os pais ou jogadas literalmente pela janela. E por fim, temos as crianças frutos da banalização do sexo, da pauperização dos afetos e da ignorância tardia das relações humanas.
Estamos criando meninos e meninas precocemente erotizados, consumistas e imediatista. Estamos ferindo, torturando e matando nossas crianças, assim, de manchete em manchete, em verdadeiros espetáculos de horrores exaustivamente explorados por todos os meios de comunicação.
Haverá um Herodes bíblico, oculto dentro de cada um de nós, a espera do primeiro instante de enfado e raiva absoluta, e do despertar da maldade original e atávica...
Dizia o velho Cristo, “deixai vir a mim as criancinhas... porque delas é o reino dos céus”. Eu na minha experiência árida e desiludida desdigo, “deixe-as no céu”. Porque somos indignos de tê-las, e amá-las e protegê-las.






Tânia Fonseca.


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