quarta-feira, 30 de maio de 2012

O colecionador...

Ele gostava de acumular coisas. Sentia um deleite infinito em acomodar coisas em aparadores, caixas e,  muito das vezes, salas inteiras. Usava o pronome da posse de forma abrangente e quase definitiva. Causava-lhe um prazer quase sensual pronunciar: - Meu carro! -Minha casa! -Meus livros...!
Sofreu dores atrozes quando tentou possuir pessoas. Na impossibilidade de dominá-las, as perdia e em perdê-las se desnorteava, se machucava. O stand de sua afetividade era de  um vazio avassalador. Uma coleção silenciosa de ausencias e indiferenças.
Ela percebeu o desvio dele na eloquencia com a qual ele reforçava suas posses e enumerava seus títulos.Percebeu a vulnerabilidade no discurso vazio sobre seus feitos e ganhos e na dificuldade em tecer à sua volta laços afetivos amigáveis e duradouros.
No último encontro que tiveram ela se deparou com um homem obscuro e ansioso. Foi sem assombro que percebeu que, apesar de ter uma sala repleta de títulos músicais ele a recebeu em um silêncio constrangedor. Não menos constrangedor foi presenciar o entusiasmo forçado com que ele lhe  apresentou sua coleção de cartas de tarot; cartas desconexas, tristes e desinformadas, onde não se vizualizava o futuro e o passado se resumia, apenas, nas nódoas presentes nas gravuras e números.
Foi lhe apresentada também; incontáveis fotografias antigas e despersonalizadas, e livros diversos,  e recortes perdidos e completamente desnecessários. E quando finalmente ele cerrou as cortinas e tombou sobre o corpo dela e a invadiu quase que com raiva, a posse veio com uma urgencia agressiva e frenética, num gozo vazio e profundo.
Fotos, livros,músicas...Tantas coisas tinha ele!
E ela só possuia o que podia reter nas lembranças ou envolver num abraço.
Viu portanto a impossibilidade do seu afeto e o desperdício desnecessário de sua ternura.
Ele não a reteve entre suas coisas... E ela o guardou na lembrança.
E não foram felizes para sempre!












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