quarta-feira, 22 de junho de 2011

O DIREITO DE NASCER.

            O nascimento é, em todas as civilizações, um acontecimento cercado de expectativas, seriedade e alegrias, afinal, trata-se da perpetuação da espécie. No ato de parir, mãe e filho encontram-se em absoluta vulnerabilidade, dependentes do bom senso e da boa vontade dos demais membros da família e do grupo em geral.
No Brasil atual, onde viver é um ato permanente de sobrevivência, nascer está se tornando uma indecência. Coitado do brasileirinho que nasce amparado por planos de saúde questionáveis ou pela rede pública de saúde. Na verdade, nascer no Brasil está se tornando um bravo ato de superação.
É vergonhoso observar o descaso com que mães humildes são tratadas na rede pública de saúde e mesmo nos hospitais de menor porte. Os profissionais e instituições, responsáveis pelo atendimento à gestação e ao parto, que deveriam amparar as mães aflitas e acolher os seus filhos, revestem-se de uma indiferença e de uma ignorância tão escandalosa que deveriam ser punidos com a reclusão e a perda do exercício da profissão.
David ia nascer em breve, sua família já tinha preparado seu cantinho, comprado roupinhas azuis e perfumado as gavetas. Mas, David não iluminou sua família com sua chegada. David e a mãe morreram, vítimas do descaso médico, afinal, David era apenas um brasileirinho simples, um a mais na estatística.
A tragédia de Manuela permitiu contornos mais elaborados. Manuela, assim, como outras três parturientes foi rejeitada na unidade materna do Hospital Miguel Couto (RJ) onde teve o endereço da maternidade a ser procurada, rabiscado nos próprios braços, pelo médico obstetra de plantão. Depois de tanta humilhação, Manuela e as outras grávidas tiveram que pegar ônibus e andar algumas quadras até serem atendidas. Manuela foi submetida a uma cesariana de urgência e sobreviveu, a filha que esperava, não.
Finalizando essa tragédia de descaso e indiferença, Manuela conseguiu voltar pra casa com vida, ainda que infinitamente mais pobre em sua humanidade e com os braços assustadoramente vazios.
Maria Vitória nasceu prematura e por negligencia dos funcionários do hospital de Itumbiara (GO) foi dada como morta. Após ser resgatada pelo pai a caminho do necrotério, lutou bravamente pela vida, por vários dias. Mas seu corpinho apesar de valente, era frágil demais e não resistiu. “O que fizeram foi uma falta de respeito com a vida dela, uma desconsideração, foi desumano!” Disse a mãe aos prantos! Alguém duvida?
O ato de nascer, de dar a luz a um novo ser é sagrado universalmente. É triste observar que no meu país o nascimento de crianças comuns está se revestindo de indiferença, descaso e omissão.
A OMS (organização Mundial da saúde) considera razoável até 20 mortes maternas por cem mil nascidos vivos. No Brasil morrem 100 mulheres por cem mil nascidos vivos, 90% pacientes do SUS. Goiana está na 9ª posição entre as capitais com as taxas de morte materna mais elevadas no Brasil. Fato que é surpreendente, haja vista nossa recente origem rural, onde o parto é um ritual capaz de agregar familiares, vizinhos, amigos e afins.
É inconcebível que uma grávida seja assistida com descaso e enfado e até agressividade. È inacreditável que ela não seja agasalhada e tenha seus temores e suas dores e inseguranças amenizadas por profissionais qualificados para isso.
Afinal, no Brasil paramos no dia 25 de Dezembro, numa festa designada Natal, para celebrarmos o nascimento incomum de um suposto menino Deus! Nascimento esse que dividiu o mundo ocidental em antes e depois e norteia os cristão há 2009 anos. Convenhamos, tempo suficiente para que as “Marias” não sejam mais ignoradas e os meninos Jesus não nasçam mais em situações tão inóspitas.
A impressão que tenho é a de que, enquanto escrevo esse artigo, inúmeras “Marias” estão parindo seus meninos (as) envoltas na indiferença e no descaso. Muitas terão suas manjedouras vazias, e muitos “Josés” choraram a ausência de ambos.
Infelizmente na vida real, não tem estrela de Belém, nem reis magos presenteadores. As tragédias da vida real, não permitem poesia. Só resta a essas famílias o pranto inconsolável e a pergunta desesperada: por quê? Por quê?


Tânia Fonseca.


taniassfonseca@hotmail.com

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